Bolsonaro perde papéis com instruções da defesa antes de depor
"Se não estiver no carro, eu tô lascado", disse o ex-presidente. Para alívio dele, o material foi logo encontrado
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) prestou depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF) na tarde desta segunda-feira, 10, no inquérito que apura uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. Logo no início, um episódio inusitado chamou atenção: Bolsonaro percebeu que havia perdido as folhas com as orientações preparadas pela defesa. Bastidor foi trazido pelo correspondente do O POVO em Brasília, João Paulo Biage.
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"Se não estiver no carro, eu tô lascado", ele comentou. Minutos depois, veio o alívio: os papéis, cerca de dez páginas com sugestões de respostas, foram encontrados.
Durante o interrogatório, Bolsonaro apareceu com um exemplar da Constituição Federal nas mãos. A oitiva ocorreu após o ministro Alexandre de Moraes negar pedido da defesa de Bolsonaro para que ele exibisse vídeos durante o interrogatório. A justificativa era de que os trechos audiovisuais dariam contexto às declarações do ex-presidente, mas Moraes considerou que esse tipo de recurso deveria ser apresentado em fase posterior do processo.
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O inquérito apura a organização e articulação de um plano para deslegitimar o sistema eleitoral, fomentar a desconfiança nas urnas eletrônicas e manter o ex-presidente no poder, mesmo após a derrota nas urnas.
Além das perguntas relacionadas à chamada “minuta do golpe”, Bolsonaro também foi questionado sobre reuniões com militares e ministros em que, segundo delações e investigações, teriam sido discutidas estratégias para não reconhecer o resultado das eleições. As respostas seguiram um padrão cauteloso, com apoio direto das anotações feitas por seus advogados.
Almir Garnier, Heleno e Anderson Torres também depõem ao STF
Além de Bolsonaro, outros nomes importantes ligados ao antigo governo prestaram depoimento ao STF nesta segunda-feira. O almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha, confirmou que participou de uma reunião com Bolsonaro após as eleições, mas afirmou que não teve contato com a chamada “minuta do golpe”, documento que previa a anulação das eleições. Garnier é apontado como um dos militares que teria aderido a uma proposta golpista, embora negue envolvimento direto em qualquer articulação ilegal.
Garnier também foi confrontado com mensagens e registros que indicariam sua disposição em apoiar um eventual decreto para impedir a posse de Lula. Segundo a versão, houve apenas discussões sobre o momento político e os desdobramentos do processo eleitoral, mas não tratativas práticas para um golpe de Estado. O militar reforçou que respeitou a hierarquia institucional e que não teria autorizado nenhuma medida fora do ordenamento constitucional.
Já o general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, optou por permanecer em silêncio diante das perguntas feitas por Moraes. A decisão está amparada por orientação da defesa, que teme uma possível autoincriminação. Ele respondeu apenas a perguntas do próprio advogado. Mesmo assim, Heleno aproveitou para minimizar falas anteriores que circularam nas redes sociais, como a célebre afirmação de que “a faixa presidencial não se entrega de graça”, classificando a frase como “mera figura de linguagem”.
Heleno é um dos nomes mais simbólicos do núcleo duro bolsonarista. Investigadores apontam que ele teria participado de reuniões reservadas em que se discutiu uma intervenção militar. A recusa em responder perguntas pode indicar que a defesa aposta na ausência de provas materiais, embora delações e registros de agendas apontem o contrário.
O ex-ministro da Justiça Anderson Torres também foi ouvido. Ele confirmou que o ministério não encontrou qualquer elemento concreto sobre fraudes nas urnas eletrônicas. Também foi questionado sobre a minuta golpista encontrada na casa dele em operação da Polícia Federal. O documento, que sugeria medidas para anular as eleições, teria sido, segundo ele, apenas um “rascunho” sem valor prático.
Nenhum dos interrogados teve confissões diretas, os detalhes e contradições entre os relatos podem embasar novas diligências e reforçar o indiciamento de parte dos envolvidos.
O STF deve retomar nas próximas semanas outras oitivas de nomes que aparecem nas delações e nos documentos já colhidos pela Polícia Federal.
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